Açucena

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domingo, 19 de fevereiro de 2017

A Casa Amarela (Maria Gonçalves Ibanhes)


Ao longe o vento uivava
E a vista mal alcançava
A caatinga do sem fim
Era tanta poeira e claridade
Que os olhos embaralhavam
Por trás da nuvem densa carmim
Abandonada à sorte
A casa amarela, ao norte
Não tinha sinal de gente
Só ninhos de maribondo
Cercavam as cercanias
Uma janela velha batia
E o vento alastrava a poeira
Que entrava pela soleira
Frestas, batentes e telhas
Assombrando o que sobrou
Só móveis velhos e retratos
Espingarda, xícaras e pratos
Memórias jogadas ao léu
No açoite da ventania
As lembranças se perdiam
E a casinha parecia
Um tristonho mausoléu
Eu só recordava um dia
Onde a vida se cumpria
Na lida do dia a dia
E o vaqueiro agradecia
Na hora da “Ave Maria”
Trabalho, sonho e alegria
E até o que não podia
Deixar um homem feliz
Mas o destino afoito
Fez o certo fica torto
Emaranhou os caminhos
Botou retas em desalinho
O vaqueiro está morto
Deixou mulher e filhinhos
Resta só nesse sertão
A casinha amarela
A cerca e uma pinguela
Plantas bravas no oitão
Na calçada de pedra
Ficou a cachorra Teca
À espera do patrão
A terra mais vazia, esvaziada
Parece muito mais acanhada
“Mais que seca, calcinada”
É a terra devastada
Sem água, dono, criação...

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